PROJETOS EXPRESSO EMPREGO - E (QUASE) TUDO A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL LEVOU
2023-12-03 06:31:07
Revolução “Uma máquina é capaz de lidar com a incerteza melhor do que o ser humano? Claro que sim!”, avisa o reputado economista Daniel Susskind. A automatização acelerada pela IA vai mudar a forma como trabalhamos. A nossa resposta fará a diferença Foto Rui Oliveira Todos os empregos podem ser divididos numa série de tarefas que têm que ser cumpridas rotineiramente. Isto parece mais óbvio nas atividades ditas de ‘colarinho azul’, aquelas que se referem ao trabalho manual associado à indústria e à classe operária. Mas também se aplica às funções de ‘colarinho branco’, aquelas que englobam profissões de escritório e administração e que aparentemente podem estar mais a salvo da automatização provocada pela inteligência artificial (IA). Ninguém escapa à transformação. A revolução chegou para ficar e vai gerar mudanças profundas e transversais a todos os sectores, precisamente porque a capacidade das novas ferramentas tecnológicas de desempenharem as tarefas que até há pouco tempo só os humanos conseguiam desempenhar cresce a cada dia que passa. “Uma máquina é capaz de lidar com a incerteza melhor do que o ser humano? Claro que sim!”, explica Daniel Susskind, o economista e autor de livros como “Um Mundo sem Trabalho”, que a partir de Londres alertou a plateia da conferência “O Futuro: evolução das organizações na era da inteligência artificial” para os desafios que se avizinham. “Nos anos 80 achava-se que era impossível” traduzir a solução de proble-mas criativos para um ambiente computacional, acredita Daniel Susskind, porque o foco estava em fazer com que as máquinas replicassem os mecanismos de funcionamento do nosso cérebro, abordagem que se veio a revelar mal direcionada. Fica de novo a pergunta e a resposta de Susskind: “As máquinas conseguem pensar? Do ponto de vista crítico, não é a questão mais importante. Conseguem fazer cada vez mais coisas, pois funcionam de forma fundamentalmente diferente dos humanos.” Perceber essa distinção foi o que permitiu o crescimento exponencial das ferramentas de inteligência artificial, além dos braços mecânicos que já são uma visão comum em muitas fábricas, e o especialista não tem dúvidas de que “os trabalhadores de ‘colarinho branco’ precisam de encarar estas mudanças a sério”. O que é “assustador” em ferramentas como o ChatGPT, por exemplo, “é a diversidade de coisas que consegue fazer”. Não é expectável que um dia um trabalhador chegue à sua secretária e veja um robô lá sentado, mas as alterações estão a acontecer e “de forma muito mais subtil”. De acordo com o relatório “OCDE Emprego Outlook 2023”, publicado recentemente, três em cada cinco trabalhadores mostram-se preocupados em perder o seu emprego para a inteligência artificial no espaço de 10 anos, enquanto dois em cinco manifestam-se apreensivos quanto à possibilidade de os seus salários descerem no mesmo período. Os cálculos da OCDE apontam para que aproximadamente 30% dos postos de trabalho em Portugal possam estar ameaçados. Daniel Susskind acrescenta que, segundo a McKinsey & Company, apenas 5% dos empregos podem ser completamente automatizados, mas 60% desses trabalhos incluem tarefas que podem ser desempenhadas pela inteligência artificial. E reitera: “É errado pensar que funções que impliquem criatividade não possam ser feitas por máquinas. Podem, mas de forma diferente.” Mudança em massa O autor acredita que o “desafio dos próximos 10 a 20 anos não é de desemprego em massa, mas da mudança em massa”. O “mais provável será aumento da procura pelas tarefas que ainda não podem ser automatizadas”, o que significará novos empregos. Para responder a esta transformação sistémi-ca é preciso treinar novas capacidades para “competir com as máquinas”, o que implica mudanças no sistema de ensino. “Se entrássemos numa máquina do tempo e viajássemos 100 anos para trás, o que se passa numa sala de aula seria muito semelhante ao que ocorre atualmente”, alega. Há uma “ideia cultural de que a educação formal” ocorre na fase inicial do nosso crescimento e que, “quando está concluída, não precisamos de nos preocupar mais com isso. É um erro tremendo”. A “melhor resposta para a incerteza” é “a flexibilidade”, ou seja, “treinar e aprender com a mesma vontade e intensidade com que o fazíamos no início da vida”. É essencial, afirma o head of ventures na Subvisual, Alexandre Mendes, “construirmos um plano de literacia digital nas escolas nos próximos dois anos” e “aceitar a falha como parte do processo de aprendizagem”, indica António Marquez Filipe, administrador da Symington e vice-presidente do Conselho de Administração da Casa da Música. Todo o cuidado é pouco, porque “as novas ferramentas oferecem a possibilidade de substituir talento, e isso é novo”, defende Pedro Moreira da Silva, CEO da Cerealis, com o CEO da DST, José Teixeira, a recordar “que já se decretou o fim de muita coisa” que acabou por não se concretizar. Para a professora na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e diretora-executiva da Fraunhofer Portugal AICOS, Liliana Ferreira, “chegou a hora de pensar como propomos futuros e lidamos com humanos”. toliveira@impresa.pt PRODUTIVIDADE NO TRABALHO Pensar o futuro das empresas perante a nova realidade das ferramentas digitais esteve na génese da conferência “O Futuro: evolução das organizações na era da inteligência artificial”, realizada pela Abreu Advogados e inserida no ciclo de celebração dos 30 anos, que teve o Expresso como media partner. O QUE DISSERAM “É um erro enorme fazer de conta que esta não é a mudança das nossas vidas em todos os sectores” Marques Mendes Conselheiro de Estado e comentador “Ficaria satisfeito que o Estado, mais que inteligência artificial, tivesse só inteligência” Luís Reis CEO da Sonae Financial Services e Sonae Fashion “Se hoje não existisse inteligência artificial, o que seria das nossas vidas?” Celeste Hagatong Presidente do Banco Português de Fomento “O que torna esta revolução diferente é estender-se a qualquer área que possamos imaginar” Carlos Oliveira Presidente da Fundação José Neves Conferência sobre o impacto da inteligência artificial no mercado de trabalho juntou várias personalidades na Fundação de Serralves, no Porto Revolução “Uma máquina é capaz de lidar com a incerteza melhor do que o ser humano? Claro que sim!”, avisa o reputado economista Daniel Susskind. A automatização acelerada pela IA vai mudar a forma como trabalhamos. A nossa resposta fará a diferença TIAGO OLIVEIRA